terça-feira, 22 de dezembro de 2009

Todo fim remete a um novo começo (III)

Mais parecia que Ângela já me esperava. Enquanto eu seguia andando até ela, um olhar meio atravessado me olhava. Era uma cara de repreensão, repúdia. Acho que eu estava possuído por uma força que me empurrava até aquele demônio de biquíni. Eu, tímido como ninguém, não parei. Passo a passo, eu ia sem medo. Fiquei frente a frente com Ângela. Parecia mesmo uma cena de filme. Acho que fiquei uns cinco segundos mudo, simplesmente olhando para ela. Por sua vez, Ângela devia estar esperando eu falar.

Do meu silêncio fez saírem as primeiras palavras. Dela. Disse-me que já me conhecia e estava impaciente com a minha demora. Claro, estranhei. Acrescentou que o ritual do mar era para mim. Até então, eu não estava entendendo absolutamente nada. Ainda não tinha dito uma só palavra. Resolvi quebrar o meu silêncio. Perguntei pelo óbvio. Como me conhecia e já me esperava? Ela sorriu.

Sorriu e desarmou qualquer possibilidade de eu voltar a sentir medo. Fiquei corajoso como se aquele sorriso fosse uma pílula para tal. A explicação dela nem mais me importava. Mas rapidamente, ela me disse que sabia que eu a assistia diariamente. Enrolava-se na tolha para evitar maiores olhares. Coitada. Ficamos conversando por uns 15 minutos sentados à beira da praia.

Ângela, apesar de séria, era uma boa pessoa. Contou-se que estava morando há cerca de um ano no Recife. Ela era de Fortaleza. Chegou na capital pernambucana a trabalho. Ela era sócia de uma empresa de telemarketing. Estava separada. Não tinha filhos (nem poderia estragar aquele corpo!). Contei um pouco da minha vida normal. Sem graça. A conversa estava tão séria, tão sem emoção, que eu já estava perdendo as esperanças de poder falar o que, de fato, fez-me ir até Ângela.

Enfim, apesar de todo papo normal que se seguia, a cearense, de repente, parou. Ficou calada me olhando. Parecia estar com sede. Ela parecia salivar. A sua respiração ficou um pouco ofegante e eu percebi isso na hora. Suei. Gelei, confesso. Ela perguntou se eu não gostaria de ir conhecer o seu apartamento. Tomar algo (tão cedo!). Eu nunca gostei muito de beber nada alcoólico. Frescura mesmo. Mas, só se eu fosse louco de recusar. Fui.

Chegamos e ela perguntou se eu me importava em esperar um pouco. Ela só queria ir ao banheiro. Não demoraria. Fiquei sentado no sofá de Ângela. Um milhão de coisas passavam pela minha cabeça. Ângela foi ao quarto e logo voltou para sala. Quase tive um ataque do coração quando olhei para ela, que estava somente de calcinha. Parecia uma miragem. Ângela, como se possuída pela mesma força que me levara até ela, sentou no meu colo de frente para mim. Nunca vou esquecer daquele dia.

Na semana seguinte, em nenhuma manhã ela esteve mais no mar. O feitiço do ritual parecia ter sido quebrado com o nosso encontro. Soube que Ângela tinha voltado para Fortaleza e já não morava mais no meu prédio. Lamentei. Mas aí chegou uma nova moradora no meu prédio. Iracema. Tinha seus trinta e poucos anos. Nossa. Nunca vi igual. Desfilava pelo hall do prédio. Fiquei louco pelo seu jeitinho. Um dia nos esbarramos no estacionamento...

Fim.

domingo, 20 de dezembro de 2009

O ritual do biquíni branco (II)

Ângela significa anjo, mensageira. Naquele momento, no entanto, eu ainda não sabia que o seu nome deveria se chamar Lúcifer, o diabo de biquíni branco. Parecia uma miragem à minha vista quando ela resolveu sair da água. Os cabelos longos estavam molhados. No seu corpo escorria a água salgada do mar. Discreta, ela logo se enrolou em uma toalha na tentativa de esconder o seu corpo perfeito. Não conseguiu nos meus pensamentos. Eu já havia gravado aquele que seria o meu mais prazeroso pesadelo.

Havia pouco mais de um ano que eu morava neste prédio. Há cerca de dois meses, pude subir no elevador com Ângela. Ainda não sabia o seu nome. Mas, claro, fiquei impressionado pela sua feição. As curvas que estufavam a calça apertada não me deixaram prender uma olhada quase que obrigatória. Dei boa noite. Ela, educada, respondeu com simpatia. Era uma voz normal. Nem me lembro exatamente se doce, aguda ou mesmo grave. Foram as nossas únicas trocas de palavras até então.

Era uma sexta-feira quando eu a vi no mar pela primeira vez. Foi inevitável cair da cama no dia seguinte para tentar revê-la. Nada. No domingo, eu que chegava de uma festa quase ao amanhecer, não me importei em esperar mais um pouco e constatar que ela não estava lá de novo. Porém, na segunda-feira, quando eu já estava quase desistindo dessa loucura... sim. Lá estava Ângela com o mesmo biquíni branco. Na água. Era impossível não esperar que ela saísse. A transparência do traje em contato com a água era quase que um alimento indispensável para meus pensamentos libidinosos.

Fiquei viciado em assistir ao programa que era quase uma reprise diária. Ângela na água. Mergulhando pelo mesmo tempo, como em uma sincronia. Com o mesmo biquíni. Semitransparente. Cobrindo-se ao sair da água. E voltando discretamente para o prédio. Ah, isso de segunda à sexta. Matando-me! Mistério danado. Eu nunca neguei que era meio curioso. Após uma semana estudando seus movimentos comecei a tomar coragem para falar com ela. Ou ir à praia. Sei lá. Eu precisava fazer alguma coisa. Ela não ia saber que eu estava lá por causa dela.

Eu fui. Minha barriga estava mais gelada que a água naquele dia. Aliás, eu não sei como Ângela tinha coragem de se jogar naquele mar gelado ma manhã. Devia ser promessa, só pode. Mas enfim. Eu fui e fiquei lá como um babaca. Tentei me alongar. Fiz que sabia o que estava fazendo. Respirava fundo olhando para o mar, como quem estivesse concentrado na natureza. Na verdade, eu até estava de olho na natureza, na paisagem... de Ângela. Naquele dia eu, finalmente, iria descobrir porque o seu nome não remetia a um anjo do bem. Tomei coragem. Esperei ela sair da água, com todo o idêntico ritual. Respirei fundo novamente. Fui em direção a Ângela...

Em breve, o terceiro post e o fim dessa história.

sexta-feira, 18 de dezembro de 2009

Tudo começou assim (I)

Eram quase 5h quando me acordei. Havia dormido mal. E isso já vinha se tornando algo constante comigo. Não lembro bem com o que sonhei, só sei que foi alguma coisa ruim. E mesmo que eu me esforçasse para relembrar, não tinha jeito. Após ter certeza que o céu estava claro, levantei-me. Fui ao banheiro e depois tomei um copo d’água. Eu sempre tomo água quando me acordo. Da movimentada avenida que passa em frente ao meu quarto, poucos carros passavam. Àquela hora, ainda se podia ouvir o barulho do mar tranqüilamente. Resolvi ir até à janela para dar uma olhada na praia. O mar estava calmo. Sequinho. Alguns corajosos já se arriscavam na caminhada matinal. Um ou outro carro passavam de forma esporádica. Nada estava diferente. Na verdade, tudo estava muito normal.

Segui deixando o tempo passar. Não estava com pressa naquele dia. De olho na praia, uma mulher me chamou a atenção. Lá estava Ângela. De biquíni branco e prestes a adentrar-se ao mar. Fiquei reparando. Ainda não a conhecia, mas já sabia o seu nome pela fama de gostosa que ela tinha no meu prédio. Aliás, é bom que se diga que essa mulher, de uns 30 anos, era minha vizinha. Misteriosa, morava sozinha e aparentava ser rica. Ninguém tinha muito contato com ela ou mesmo sabia um “algo mais” sobre a sua vida. Porém, era inegável que essa mulher arrancava os olhares de qualquer homem com um pouco mais de libido.

E eu, com os meus vinte e poucos anos, claro, era um desses que não deixavam de olhar essa mulher intrigante. Solteiro, estagiário, sem muito dinheiro, eu provavelmente ficaria só na vontade. Talvez eu até já tivesse encontrado com Ângela, no meu banheiro, sozinha comigo cá em meus pensamentos. Era o único jeito.

Passavam-se os minutos e lá estava eu intacto na janela do meu quarto olhando Ângela. Eu mal conseguia piscar, na expectativa de vê-la sair da água. Não sabia que ela tinha esse costume de acordar tão cedinho para se banhar no mar. E se eu soubesse, com certeza, o meu sono já teria acabado mais cedo por outras vezes. Ela, enfim, saiu da água.

Acompanhe os próximos capítulos...